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Grupo de bilionários tech gera mais filhos para criar 'raça superior'

Elon Musk segura seu filho com a cantora Grimes: bilionário já tem 10 - Reprodução/Twitter
Elon Musk segura seu filho com a cantora Grimes: bilionário já tem 10 Imagem: Reprodução/Twitter

Abinoan Santiago

Colaboração para Tilt, em Florianópolis*

30/11/2022 04h00Atualizada em 01/12/2022 10h46

Pais de dois filhos, um menino de 3 anos, e uma menina recém-nascida, o casal abastado norte-americano Simone, 35, e Malcolm Collins, 36, quer ter mais cinco. Mas o desejo não é porque gostam ou não de crianças.

Com taxas de natalidade caindo em vários países, eles querem que cada um de seus descendentes tenha oito filhos nas próximas 11 gerações para que assim a linhagem Collins supere o número da população humana.

O casal rico de Dallas não está sozinho nessa missão. O chamado "movimento pró-natalista" tem atraído atenção de um grupo secreto composto por bilionários, como é o sul-africano Elon Musk, que possui dez filhos. Também tem estimulado o surgimento de startups de bioengenharia para que pais possam escolher a melhor genética possível para o embrião. A ideia é que a linhagem da família se torne cada vez mais superior.

Um embrião com mais "colunas verdes"

Uma das empresas de tecnologia mais famosas do ramo é a Genomic Prediction, dos Estados Unidos. Foi através dela que os Collins escolheram o embrião para feritilização in vitro do terceiro filho. Simone e Malcolm optaram por uma menina após se submeterem ao exame "LifeView", que oferece pontuações de risco para 11 possíveis distúrbios poligênicos, como esquizofrenia e cinco tipos de câncer.

De posse de uma planilha na qual cada linha representava um embrião e cada coluna um possível fator de risco genético, os Collins decidiram priorizar o com melhor desempenho na categoria "traços adjacentes ao desempenho mental". Nela, eram avaliados estresses, chances de sofrer com depressão, alterações de humor, ansiedade e TDAH (Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade).

Assim, o embrião da linha número 3 foi o selecionado por apresentar mais colunas verdes.

Apesar disso, o teste não é garantia de que a futura filha dos Collins deixará de ter algum problema mental, pois é levado em conta apenas a genética, sem considerar o mundo social no qual a criança terá contato no futuro, podendo afetar o caráter e o comportamento dela.

Malcolm e Simone Collins e seus dois primeiros filhos - Divulgação - Divulgação
Malcolm e Simone Collins e seus dois primeiros filhos
Imagem: Divulgação

O casal nega que isso seja uma espécie de escolha sobre quem vai ou não nascer.

"Eu não estou eliminando pessoas. Quer dizer, estou eliminando do meu próprio 'pool' genético", se contradiz Simone em entrevista ao site Business Insider. Já Malcolm acredita que, se forem bem-sucedidos no plano traçado para as próximas 11 gerações , os Collins podem "definir o futuro de nossa espécie".

Combo de privilégios: dinheiro, classe social e agora DNA

Stephen Hsu, cofundador da Genomic Prediction, admite que a escolha pelo melhor embrião por famílias ricas, algo possibilitado pela tecnologia, vai acentuar ainda mais a desigualdade no futuro, pois além de já nascerem em lares bem-sucedidos financeiramente, os bebês terão pré-disposições genéticas melhores e deverão ser mais saudáveis do que os mais pobres, que não podem pagar.

Na Genomic Prediction, por exemplo, o teste poligênico custa US$ 1 mil (mais de R$ 5,3 mil) com um adicional por embrião analisado, segundo a agência de notícias Bloomberg. Ou seja, quanto mais análises, maiores os custos.

De certa maneira, é a forma mais brutal de desigualdade. Esse cara vai ser capaz de ter 20 filhos e, na verdade, 20 muito, muito saudáveis, tão bons quanto a tecnologia moderna pode torná-los; enquanto outras pessoas não podem se valer disso. Stephen Hsu ao Business Insider.

Movimento pró-natalista atrai Musk

O movimento pró-natalista tem ganhado seguidores pelo mundo, principalmente entre magnatas da tecnologia. Eles acreditam que, com a taxa de natalidade dos países desenvolvidos caindo a cada ano, as economias deverão entrar em colapso, podendo ruir suas riquezas.

Outra justificativa é a de que o mundo não precisa apenas de mais gente, mas também de pessoas capazes de suportar mudanças climáticas e novas doenças para assim se manterem produtivas economicamente para as suas épocas.

A teoria seria endossada por Elon Musk, pai de dez filhos conhecidos oficialmente com três mulheres diferentes.

Discreto sobre sua vida pessoal, não se sabe se Musk adotou alguma tecnologia de escolha genética de embriões em algum dos seus filhos, mas uma fonte que trabalhou diretamente com o bilionário informou ao site Business Insider que esse interesse de ter muitos filhos e geneticamente mais "avançados" era citado pelo empresário desde 2005.

"Ele leva muito a sério a ideia de que sua riqueza está diretamente ligada ao seu QI", disse. Segundo essa fonte, Musk ainda teria pedido a outros homens ricos que pudessem ter o maior número possível de filhos.

Um futuro de pessoas idiotas?

Publicamente, o temor de Musk é o de que o enredo do filme cult "Idiocracia", de 2006, vire realidade.

A comédia sugere que, após a reprodução irrestrita de famílias com baixa formação educacional e a hesitação das pessoas "inteligentes" em não ter muitos filhos para não atrapalhar a carreira, o mundo passa a ser dominado por gente estúpida.

Ele acontece em 2505, quando o presidente eleito é uma estrela da luta livre e a população sofre de fome porque as plantações passaram a ser irrigadas com Gatorade.

"Quando pergunto a meus amigos por que ainda não estão tendo filhos (muito poucos estão), parece exatamente como no filme. Pode ser um documentário, já que está se tornando realidade", publicou Musk, em 18 de junho de 2022, no Twitter, acompanhado de uma cena da comédia.

"A população mundial está acelerando em direção ao colapso, mas poucos parecem notar ou se importar", afirmou Musk, em outro post, cinco anos antes, em 2017.

Sam Altman, cofundador da startup OpenIA (que já foi de Elon Musk), também é um entusiasta pró-natalista. Ele foi um dos primeiros investidores da Genomic Prediction. Ele também colocou dinheiro na startup Conception, que pesquisa como cultivar óvulos humanos viáveis a partir de células-tronco e permitir que dois homens biológicos possam se reproduzir.

"Acho que ter muitos filhos é ótimo", disse Altman no recente evento "Futuro Inteligente de Greylock".

Em sua reportagem, o Business Insider revelou que bilionários da tecnologia têm se reunido secretamente para falar sobre a povoação do mundo no futuro. O movimento é "grande aqui em Austin", disse Linda Avey, cofundadora da empresa de análise genética 23andMe, ao Insider.

O diretor da startup Dialog, Raffi Grinberg, também confirmou que o declínio da população é um tema comum entre os CEOs que participaram dos retiros não-oficiais do grupo.

Outro adepto é Luke Nosek, cofundador do PayPal. Ele teria até realizado, em fevereiro, uma reunião em sua casa com bilionários para discutir o "fim da civilização ocidental", revelou a reportagem. Outro entusiasta é o cofundador do Skype, o estoniano Jaan Tallinn, pai de cinco filhos, que também investiu na Conception.

Tecnologia troca os 'bits' pela biologia

A tendência pode estar afetando até os investimentos no Vale do Silício, diminuindo interesse nas 'big techs' tradicionais em prol das 'biotechs'.

Dados da consultoria PitchBook mostram que a maior rodada de investimentos de 2022 aconteceu com a BillionToOne, em julho, quando a empresa captou US$ 125 milhões de uma só vez. A startup atua com diagnóstico molecular de rastreio de condições genéticas comuns e graves em bebês em gestação.

Formas de fertilização in vitro são a nova tendência do Vale do Silicio - iStock - iStock
Formas de fertilização in vitro são a nova tendência do Vale do Silicio
Imagem: iStock

Outra rodada de investimento de destaque é da Gameto, que busca soluções para estender a janela de fertilidade das mulheres, com a captação de US$ 40 milhões. Um dos investidores é o cofundador da XPrize, Peter Diamandis, e a cofundadora da 23andMe, Anne Wojcicki.

Ao todo, de acordo com a PitchBook, o Vale do Silício tem 138 negócios voltados para reprodução humana. É mais do que o dobro de 2016, quando eram 57.

"O século 20 foi sobre átomos e bits. O século 21 é sobre biologia e bebês", disse um investidor anônimo da Genomic Prediction ao site Insider.

*Com informações do Business Insider, Bloomberg e PitchBook.